sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Conferência «Como nos tornámos humanos»

O Serviço de Ciência da Fundação Calouste Gulbenkian, realiza no Auditório 2 da Fundação Calouste Gulbenkian (Av. de Berna, 45 A) a conferência – COMO NOS TORNÁMOS HUMANOS – que terá lugar no dia 21 de Janeiro, às 18h00, e será proferida pela Profª. EUGÉNIA CUNHA da Universidade de Coimbra.

Poderá também assistir em directo através do site: http://live.fccn.pt/fcg/ e enviar as suas questões (darwin@gulbenkian.pt) que o orador responderá no final da sessão.

Resumo:
COMO NOS TORNÁMOS HUMANOS
EUGÉNIA CUNHA
Esta pergunta recorrente que se coloca desde sempre vai buscar respostas a várias ciências e permanece um dos maiores desafios da antropologia e da biologia. Leva-nos a uma inevitável e fascinante viagem ao nosso interior e no tempo porque o entendimento de onde viemos elucida também sobre para onde vamos. E no exercício de mergulhar no passado, há que recuar até há cerca de 7 milhões de anos para encontrar os mais prováveis candidatos a primeiros hominídeos. Desde eles até ao presente, passamos por uma cadeia impressionante de antepassados, directos e indirectos, que vamos colocando na nossa árvore evolutiva, densamente ramificada mas da qual só conhecemos uma parte dos inquilinos. Falaremos de alguns deles, onde, como surgiram e como se relacionam connosco. As peças do puzzle vão surgindo com as novas descobertas e com a reavaliação de outras. Cada uma dessas peças conta-nos uma história. Mas cada vez mais, não são só os fósseis que permitem reconstruir a nossa história natural. O acesso ao nosso genoma e ao de alguns dos outros primatas levou-nos para uma nova era em que se procura identificar os genes e as alterações genéticas que nos tornaram únicos. A nossa singularidade remete-nos inevitavelmente para o órgão mais complexo do universo, o nosso cérebro. Recentemente, foi sugerido que um determinado gene, o HAR1F, possa vir a ajudar a perceber porque somos os mais encefalizados de todos os primatas. Mas temos que reconhecer que somos muito mais do que genes. A velha máxima “ somos aquilo que comemos” continua válida e o segredo do aumento do nosso cérebro, um autêntico devorador energético, parece ter sido contrabalançado por uma concomitante redução do aparelho gastrointestinal viabilizada por uma mudança na dieta. A incorporação de mais carne na dieta terá facilitado o crescimento cerebral. A hipótese ETH- Expensive- tissue hypothesis é aqui cruzada com o aumento do período de gestação, com a prematuridade do recém-nascido humano e com o crescente investimento parental por parte dos humanos como uma explicação possível para o facto de o nosso cérebro ser três vezes maior do que aquilo que seria de esperar. Mas este não é o nosso único traço distintivo. O bipedismo e a nossa linguagem têm sido cruciais para termos chegado onde hoje estamos. A chave está no cruzamento de todos estes traços distintivos, dos genes a eles subjacentes e na sua correcta contextualização ecológica. Sabendo que a evolução não é gratuita e que só quando os benefícios de uma dada mudança evolutiva superam os custos é que o processo avança, é um desafio destrinçar as cada vez mais peças chave deste intrincado ser que somos com a certeza de que muitas das questões só serão respondidas ao longo do próximo século, quiçá, no próximo grande aniversário de Darwin que, acredito, continuaria a dizer” Light will be thrown on the origin of man and history”.
21 de Janeiro de 2008




Eugénia Cunha é Bióloga, doutorada em Ciências (especialidade Antropologia, 1994); é professora catedrática de Antropologia, do Departamento de Antropologia, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra desde 2003.
A evolução humana sempre foi uma das suas áreas científicas prioritárias porque entende que o conhecimento da história natural do homem é crucial para várias ciências tais como a Antropologia e a Biologia. Ver o homem como um Primata, conhecer os primatas não humanos, é um modo insubstituível de nos conhecermos. Entender o nosso passado é também indispensável para perspectivar o nosso futuro como espécie. A evolução humana é uma ciência eminentemente transdisciplinar, sujeita a mudança, rica em descobertas de vários tipos e em que a ausência de evidência não é evidência de ausência. A divulgação e o ensino da Paleontologia Humana têm sido uma constante.
Entre outros, criou e desde 1998 é responsável pelo Mestrado em Evolução Humana, agora 2º ciclo em Evolução e Biologia Humanas do Departamento de Antropologia da FCTUC. Nas licenciaturas de Biologia e Antropologia lecciona desde 1985 disciplinas de Evolução Humana e Paleontologia Humana.
Orienta/ou cerca de 30 teses de Mestrado na área em questão; orienta/ou 16 teses de doutoramento (incluindo 7 bolseiros da FCT). Preside o Departamento de Antropologia da FCTUC e o GEEV, Grupo de Estudos em Evolução Humana
http://www.geevh.org/, cujo lema é “ a especialização conduz à extinção”.
Ministrou vária conferências, debates e seminários em Evolução humana em Universidades nacionais e estrangeiras assim como em Escolas Secundárias. Desde 1987 participa em congressos internacionais sobre evolução humana.
Tem desenvolvido e colaborado em vários projectos na sua área tais como o Projecto Ciência Viva sobre a divulgação da Evolução Humana intitulado “ A Grande Árvore da Evolução Humana” 2007.
cunhae@ci.uc.pt



NO CAMINHO DA EVOLUÇÃO
Novos conceitos e poderosas ideias acompanharam o estabelecimento das sociedades modernas que hoje povoam a Europa, tais como o heliocentrismo (que Copérnico foi beber à Itália renascentista) implicando que o nosso planeta tenha uma origem comum – a poeira cósmica; o movimento uniforme como estado de equilíbrio no universo e não o do repouso (o princípio da relatividade de Galileu); a gravidade como explicação dos fenómenos nos céus e na Terra (a atracção universal de Newton); a origem comum das espécies vivas neste planeta (a teoria da evolução de Darwin); e a equivalência entre massa e energia que permitiu a Einstein unificar as causas e a dinâmica dos corpos em movimento.
Entre estes, aquele que provocou mais acesos e emocionados debates foi sem dúvida o da evolução dos seres vivos por selecção natural na luta pela sobrevivência. Perceberam as elites dirigentes, bem como os donos dos princípios éticos e morais da época, que a teoria de Charles Darwin vinha relegar para o infinito o último elo com o Além que ainda restava na natureza: o da origem divina dos seres humanos. Os conceitos de evolução, de transformação e de adaptação, mostram como a mudança é omnipresente em tudo o que se relaciona com a nossa realidade – nas suas três vertentes: a exterior, a social e a interior.
A investigação científica em biologia mostra igualmente como a evolução e a selecção dos seres vivos está a acontecer todos os dias, em todos os instantes. É, assim, fundamental que encaremos o mundo segundo uma perspectiva que acolha os ensinamentos da ciência. Só é possível mudar o mundo se mudarmos o modo como o olhamos – e tornarmos consequente essa mudança. É isso que fazem todos os povos que apostam no seu futuro.
A Fundação Calouste Gulbenkian vai por este motivo realizar uma exposição intitulada “A Evolução de Darwin” entre 12 de Fevereiro e 24 de Maio de 2009, para comemorar os 200 anos do nascimento de Charles Darwin e, simultaneamente, a passagem de 150 anos sobre a publicação da sua obra seminal “A Origem das Espécies”.
O presente ciclo de conferências pretende que todos se iniciem ou (se já iniciados) prossigam “No Caminho da Evolução”, criando continuamente imagens construtivas e positivas de si próprios e dos outros, na interacção com a sociedade e o meio ambiente, preparando o clima de saudável circulação de ideias e de aprendizagem que a Exposição de 2009 certamente proporcionará.

João Caraça
Director do Serviço de Ciência




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