quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Comunicações do Encontro Temático da Rede Social " Por uma Cultura de Parceria"





“O aqui e agora, numa perspectiva de futuro em Parceria”

O trabalho em Rede e o estabelecimento de parcerias constitui, hoje, um
dos pilares fundamentais da racionalização de procedimentos e da gestão
eficiente de meios. As novas políticas sociais exigem que, da forma como
nos organizamos, saibamos ir mais além, quer nos situemos a nível micro:
no aqui e agora de uma Junta de Freguesia, como é a de São Julião do
Tojal, quer a nível macro, analisando globalmente a realidade sócio-política
de que todos fazemos parte. E, enquanto cidadãos de uma sociedade, à qual
muitas vezes, empiricamente, atribuímos as causas de fenómenos sociais a
factores dos quais a nossa acção directa ou indirectamente faz parte,
podemos decidir se queremos apenas ser observadores destes, criticando
sem propor alternativas, ou sermos participantes de uma realidade social,
que idealizamos mudar para melhor.

Participar numa Rede envolve mais do que a inter-comunicação a respeito
dos trabalhos que um grupo de organizações e/ou instituições realiza
isoladamente. Estar em Rede significa realizar, conjuntamente, acções
concretas conducentes à modificação das organizações, ajudando-as desse
modo, a alcançar os seus objectivos, marcando a diferença no que se faz.
O conceito de Rede transformou-se, nas últimas décadas, em uma
alternativa prática de organização, possibilitando processos capazes de
responder às exigências de flexibilidade, conectividade e descentralização
das esferas contemporâneas de actuação e articulação social.

Tendo em atenção que “O todo é mais que as somas das partes”, a
Comissão Social de Freguesia de São Julião do Tojal, sendo um órgão
agregador de articulação e de integração com vista ao Desenvolvimento
Social Local, em participação com os vários parceiros sociais que a
constituem, tem reflectido na procura de soluções integradas e partilhadas,
conducentes ao desenvolvimento da Freguesia. Contudo, a contribuição
para a criação de condições ao desenvolvimento social, assente no
cumprimento das competências legais instituídas e no incremento de
estratégias concertadas entre as Instituições/Organizações Públicas e/ou
Privadas não é ainda na sua totalidade alcançado.

O objectivo de uma intervenção pró-activa no quadro de um futuro em
Parceria é o resultado que se pretende, não só através desta comunicação,
mas ultrapassá-la, para assim a implementar com todos os que contribuem
para o desenvolvimento social local, nomeadamente através de
conhecimentos técnicos, intervenção comunitária ou amplitude económica.

Sabemos que no mundo e em Portugal, reflexo da economia global, nos
últimos meses, tem-se visto e ouvido coisas que se pensava estarem
definitivamente remetidas ao passado e como tal novas para as actuais
gerações: são os cidadãos a vivenciar a subida em flecha dos preços de
bens básicos como os combustíveis ou o pão; é a subida das taxas de juro a
tornar o sonho da compra de uma casa num pesadelo; é a classe média a
perder poder de compra de forma significativa; é o surgimento de uma
pobreza envergonhada. Estamos pois perante o que muitos denominam de:
a Crise do Século ou a Mãe de todas as crises.

Factores externos, como a subida dos preços do petróleo e dos cereais e a
crise financeira mundial, aliada à velocidade com que estes fenómenos
acontecem, explicam a súbita agudeza destes sintomas. No entanto ela não
é mais do que o resultado de uma patologia que, há mais de uma década se
vinha a evidenciar, mas que não foi devidamente tratada, resultando
naquilo a que todos estamos a vivenciar e cuja dimensão ainda não
podemos quantificar.

Toda esta nova conjuntura, com novas realidades que pensávamos não
poderem acontecer, traduzem-se num sentimento de medo e desconfiança
generalizada sobre as instituições. O medo de que, pela primeira vez na
história recente, o futuro traga uma vida pior. Pessoalmente, a ideia que até
agora tinha sobre o futuro para os meus filhos mudou, pois preparava-os
para usufruírem de uma vida melhor, mais próspera e abundante do que a
minha, mas neste momento sou obrigado a transmitir aos meus filhos que
se preparem para uma vida futura pior ou pelo menos mais difícil que a que
tenho no presente.

Se começamos por falar do que se passa em Portugal, é apenas porque
representa, com algumas variações, aquilo que se tem passado no resto do
mundo desenvolvido.

Desde a Segunda Guerra Mundial que os ocidentais se habituaram a dar por
garantido que a alimentação, para eles, seria sempre cada vez mais
abundante e mais barata. Relativamente ao petróleo, as incertezas foram
sempre maiores, quanto mais não seja porque se sabe que, um dia, ele irá
acabar, mas mesmo assim a súbita subida de preços dos últimos anos apanhou-nos de surpresa. Portanto, muitos dos problemas que enfrentamos
agora e que tão desprevenidos nos apanharam foram identificados há muito
tempo.

Se o actual impasse quanto à adopção de políticas que resolvam o problema
da alimentação da humanidade se mantiver, e se, ainda por cima, a presente
crise financeira se traduzir numa crise económica (da qual já começam a
existir fortes e abundantes sinais), mas por enquanto com reflexos apenas
em sectores sócio-económicos elevados, o mundo - fruto de um conceito
de organização económica inspirado no neo-liberalismo puro - irá
mergulhar numa recessão profunda, estando criadas as condições para o
surgimento de uma «tempestade perfeita»: uma crise económica, alimentar
e humanitária de proporções inimagináveis não só nos países mais pobres
mas generalizada ao mundo.

O cidadão comum, fruto de uma política económica estribada no consumo,
muito dele supérfulo e reflexo de um acesso fácil ao crédito, em que a
sociedade considera como legitimo e irrepreensível o uso do crédito para a
aquisição de bens não essenciais, está a viver uma crise que o obriga a uma
gestão do orçamento familiar, até aqui por vezes desvalorizada e com a
alteração de hábitos de consumo que já não consegue sustentar.

Todos nós, seguramente, conhecemos casos de famílias, muitas jovens,
com emprego, em que os seus ordenados são todos consumidos com o
pagamento dos empréstimos. O como é que vivem? Quais as respostas a
esta nova situação, que até à pouco tempo seria a excepção, mas que
ameaça ser a regra?
A primeira abordagem a esta problemática é que, nas crises o estado, mais
que regulador, deverá ser promotor. E aqui promover é centrar a acção num
novo paradigma organizacional e económico, face aos novos problemas
sociais que se apresentam.
Creio que a nível macro o Estado está a desenvolver medidas concretas de
apoio às famílias nestas condições.
No entanto, a mudança da estrutura económica deverá ser promovida, a
longo prazo, com uma grande incidência na educação, ou seja, numa
mudança de mentalidades e consequentemente de comportamentos, pois
sem educação não há, seguramente inovação, não haverá condições para a
mudança.

A nível micro social, e num contexto geográfico de uma Junta de
Freguesia, no âmbito da Rede Social de Loures, deveremos melhorar o
atendimento e intervenção junto das famílias já caracterizadas como
multiproblemáticas e agora junto de outras, que até ao momento não
necessitavam de apoio sócio-económico, mas cujos fenómenos
anteriormente referidos, fizeram transpor a condição social de classe média
para uma nova classe social de famílias: “As famílias sobre endividadas”,
nas quais, como já referimos, ambos os cônjuges trabalham. Estas, com
problemas emocionais acrescidos e num emaranhado de problemas muitos
deles novos a que, sozinhos, seguramente, não conseguem fazer face.

A percepção empírica que temos da primeira tipologia de famílias
abordadas – as multiproblemáticas-, conjugada à crise anteriormente
referida, faz prever que o fenómeno da exclusão e da pobreza nas famílias
tenderá a aumentar num futuro muito próximo e será transversal a todas as
famílias. Se por um lado, estas famílias sempre viveram com dificuldades
sociais, muitas vezes transgeracionais, com dependências ao nível dos
apoios da acção social; a nova tipologia de famílias nunca recorreu a
qualquer apoio da acção social, tendo a vergonha, inclusive, como emoção
associada à sua nova condição.

Estas novas realidades, em constante mudança, obrigam a que as politicas
sociais e correspondentes respostas sociais se centrem nas redes e se
constituam como um instrumento de trabalho, inclusive na preparação dos
programas de apoio, através dos conselhos locais de acção social.

O quadro legal que regula as atribuições e competências das Juntas de
Freguesia, atribuiu-lhes competências nos domínios da educação, cuidados
primários de saúde, acção social, desenvolvimento e protecção da
comunidade, mas numa lógica de apoio e colaboração a Instituições.

Assim, dadas as limitações legais à actuação das Juntas de freguesia, a
Rede Social, numa perspectiva de parceria, é o contexto que permite a
efectivação de actividades de apoio social à comunidade, algumas já
iniciadas pela Comissão Social de Freguesia de São Julião do Tojal, dando
continuidade ao trabalho desenvolvido - desde a sua constituição como
Comissão Social de Freguesia - e, tendo por base o Conselho Local de
Acção Social, que formata a intervenção.

O instrumento indicado seria a realização de Contratos Programa, que não
inibam o trabalho, mas sim que possibilitem a criação de novas acções de
intervenção, definidas entre a correspondência respostas-necessidades, que
a actual conjuntura sócio-económica exige.

Este Contrato Programa deverá ser pró-activo na descentralização de
competências, com correspondência de meios financeiros, que neste
momento estão vedados para a acção social, nas freguesias que pretendam
fomentar a definição e implementação de projectos de intervenção social e
que sejam validados pelas organizações parceiras intervenientes, conforme
atribuições das Comissões Sociais de Freguesia e desta forma, colaborar na
realização de iniciativas de interesse para o desenvolvimento da Freguesia
e do Concelho.

Face a esta nova conjuntura e na minha qualidade de cidadão e de
Presidente de Junta devo questionar-me sobre quais são as prioridades no
investimento e nas acções que devo promover.
Deverá continuar-se a dar prioridade ao betão, às estradas, e às festas ou,
pelo contrário, deverão ser criadas formas de apoio às famílias
necessitadas?

Na verdade, será prioritário o investimento num parque infantil para nele
brincarem crianças com fome, ou deverá ser adiado esse investimento e
utilizar-se essa verba para apoios efectivos a essas famílias? A mesma
questão é válida para festas, que são importantes, mas seguramente não são
prioritárias.

Chego, pois, à conclusão que o betão, priorizado no passado, deverá ser
agora secundado, em prol da acção social, pois num futuro que está já em
acção, as necessidades de subsistência, ou seja, a alimentação, a medicação
e o vestuário, são gritantes para agregados familiares que, sozinhos, não as
conseguem suprimir.

Mas, sejamos realistas, para corporizar as respostas às carências
diagnosticadas é necessário que a legislação preveja a atribuição de verbas,
para, em parceria, implementar estratégias de acção, numa estrutura
económica de difícil alteração no imediato.

Enquanto tal não acontece a Junta de Freguesia de São Julião do Tojal irá
continuar com os recursos humanos que dispõe a implementar o plano de
acção social local definido. De forma a potenciar a sua intervenção, a
proposta de orçamento para 2009 irá ter uma dotação orçamental para dar
resposta a situações-problema, às quais as outras organizações/instituições
não consigam responder, nomeadamente por falta de meios ou por
esgotamento de verbas.

O Banco Alimentar Contra a Fome, por exemplo, desenvolvido em parceria
com a Santa Casa da Misericórdia de Loures, neste momento já não tem
vagas para apoiar mais famílias, tendo inclusive lista de espera, por isso em
conjunto e em parceria, não podemos ficar inertes à espera de uma vaga,
enquanto a crise, o desespero, aumenta em cada família.

Esta procura de respostas às necessidades da população, que se dirigem
cada vez com mais afluência à Junta de freguesia, representando para estas
o serviço mais próximo ao cidadão, exige, que subjacente se concretize,
tendo por base a metodologia do Atendimento Integrado, uma nova
resposta ao diagnóstico social construído por todos os parceiros que fazem
parte desta Comissão, ou seja, o “Gabinete de Apoio à Família”.

Este gabinete, para onde estamos a caminhar em São Julião do Tojal,
obriga à definição de mudanças: começando por nós próprios, nos outros e
nas organizações de que fazemos parte. Desta forma, a abordagem familiar
a implementar visa promover a própria acção das famílias, ou seja, estas
deverão ser participantes activas das suas próprias mudanças e o trabalho
que se desenvolve com elas. Não deverá constituir apenas mais um serviço,
mas que promova a integração dos diversos programas/serviços já
existentes.

Trabalhando com estas famílias tentaremos evitar que se sintam sós no seu
ajustamento emocional, o que influenciará positivamente o processo de
adaptação à sua nova situação e isso influenciará todos os membros da
família. Quanto mais precocemente os pais e/ou a família tiverem apoio,
mais depressa conseguirão ultrapassar a sua “desorientação” inicial e
enfrentar os novos desafios que se lhes apresentam.
A Rede Social, enquanto centralidade, e as Comissões Sociais de Freguesia
deverão delinear, o melhor possível, o futuro, isto é, se a intervenção
desenvolvida até ao momento continua a ser válida perante a presente
conjuntura, ou se a intervenção deverá ser prevista segundo uma projecção
a longo prazo, baseada no Desenvolvimento sustentado e integrado, assente
em três pilares:
1. Riqueza económica actual (recursos);
2. Desenvolvimento Social;
3. Construção de um Mundo Melhor, através, por exemplo de uma
Cultura de Parceria.

A Rede ganha, assim expressão e legitimidade na medida em que suscita o
interesse dos seus integrantes originais e de novos actores em participar e
contribuir para o seu desenvolvimento. E, o desenvolvimento passa por
equacionar respostas alternativas ou antes complementares às existentes.
Porque neste momento o desafio conjunto é a construção de uma ponte
entre a economia e o social, recentrando-se no indivíduo.

Fernando Manuel Palminha Martins
Presidente da CSF São Julião do Tojal
Museu da Cerâmica de Sacavém, 4 de Novembro de 2008

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